Nove anos. Hoje.
Destino pontuado. Tempo para despedida.
Mãe arrumou-se para viajar. Menina cresceu.
Não deu tempo nem de calçar os saltos.
Nem tempo. Nem chance. Nem alegria.
Deve ser por isto que ando descalça. Não deu tempo.

Na cabeça. Na sua. O bilhete, A passagem.
Na cabeça. Na minha. Ponta-cabeça. Estilhaços.
Mil pedaços de mim. Infinitos nossos em nós.
Uma na outra. Leves. Diante do ponto. Final.
Ponto final. Sem choro.

Leve… És de uma leveza de anjo. Amiga dos anjos.
Sempre foste. Sábia, Forte. Grande. Generosa.
Lindo sorriso… alvo e preciso com os teus passos pela vida.
Vida minha. Amor meu. Dor minha. Onde encontro-me. Hoje.
Nove meses. Nasci. De ti. Gostas de nuvesn flores. De azul.
Gostas de gargalhar. Nada comedido. Alma menina chora agora.
Não nasceste para nada modesto. Nem sorrisos.

Nove anos. Hoje. Tempo esgotado. Rescindido.
A menina chorou. Adiou-se a viagem. Tempo breve.
Densos dias. Amorosos intensos meses.
Poucos. Mas muito. Muito todo o sentimento.
Despejado de vez. Sulgado para dentro em queda livre.
Veloz a força do amor. Cruel a força do tempo que corre. Da vida.
Vida para a tua ausência. De minha vida.

Adiou-se a viagem. Mas não vendeu-se o bilhete.
Bilhete a vencer. Tempo a correr. É chegado o tempo.
E minha ausência de lugar no espaço. De chão. No chão.
Prometeste-me um anjo. No meu choro para dentro de mim.
Um anjo. Prometeste-me enviar. De lá. Do lado de lá.
Do lado de mim tem um anjo. Enviado. Do lado de lá.
Hoje. Um anjo me toma. Me aporta a alma-lama.
Antecipa-se do meu eu. Dos meus desejos. Me acalma.

Nunca fui previsível. Sempre tão inconstante.
Mas sou tão previsível. A ele. Só a ele.
Como um livro lido diversas vezes.
Sabe de todas as páginas, linhas e entre-linhas.
Sabe até bordar… coloridas linhas usas em mim.
Sabe pintar também. Pinta lindas cores em mim.
Eu permito. Eu quero. Eu preciso.

Hoje. Nove anos. Bilhete de passagem. Destino pontuado.
Hoje. Anjo bom. Tu. Lavas-me todos os dias a minha lama-alma.
Perdoas e, por vezes, choras. Eu choro teu choro.
O de não poder voltar. O de não poder começar consigo.
Apenas recomeçar. Se ré. Sem dó. Sem dor.
Apenas com músicas de anjos…
As que sopra em meus ouvidos quando vou dormir.
Dormir. Para a vida.
Acordar para ela. Sonho bom.
Viver para ti.
Apenas te peço. Anjo de mim… Ou a Deus em prece…
Não compras o bilhete. A passagem.
Deixa esta próxima viagem… para mim.

Karla Mello
04 de Julho/2011